sábado, 26 de abril de 2008

Fingimentos

Olho para o tufas lá fora ao sol, todo estendido, deliciado...Até parece que foi sempre assim, nesta casa onde agora está.
Rei e sr. As cadelas param para ele passar, a gata fica a vê-lo comer esperando a sua vez. Salta para cima da mesa e rouba comida indiferente aos protestos.
Durante um mês o meu coração partia-se de cada vez que entrava naquela casa e te via no escuro da sala fechada, chamando ansioso pela nossa presença. O curto tempo que o coração lá nos permitia estar, era preenchido com ron-rons e "amassadelas" mútuas, por entre as lágrimas q me escorriam pela face "O q vai ser de ti tufinhas?"
Lembro-me qdo te trouxe para casa da Nanda... no carro pensei q n ias aguentar, o meu coração espremia-se numa reza esperançosa de q ia correr tudo bem. E correu. Parece q sempre viveste aqui.
Ainda assim,pergunto-me por vezes, se os miados solitários q lanças à noite de qdo em qdo, são a chamar por eles...pergunto-me o q viste, o q compreendeste...
Ontem fui à avó. O Yukie fez uma festa q...jesus. Lembrei-me também do seu jejum de 1 semana e das outras a comer só á mão. O teu lombo estreitado e lágrimas secas nos teus olhos. De cada vez que chegávamos, tu ali, firme, guardando a casa, à espera...seria de nós...ou de quem nunca mais vai chegar...?
Ontem na avo, onde acho q estás melhor apesar da limitação dos movimentos, passou-me pela cabeça o pensamento q também me varreu olhando agora para o tufas e q me tem ocorrido tantas vezes nos últimos tempos. Penso "tenho de lhes(pais)contar esta" para logo a seguir rematar "olhem, enquanto estiveram mortos, aconteceu isto e isto..."
Parece estúpido, não?...mas a verdade é que tudo isto ainda me parece mentira. Parece-me q foram viajar...Nas partes da casa em que o olhar não se confronta com a tragédia...posso fingir que foram viajar, que foram ao jumbo...posso fingir...
Ontem fui lá a casa, abri os armários e pensei na quantidade de gente q me diz que essa tarefa das roupas é bem mais fácil se for feita de inicio...Olhei para a roupa e pensei "porque vou tirar isto daqui"...voltarão eles?...claro que não...mas n consigo é alcançar o vazio daqueles armários. Já basta o vazio daquela casa sem eles.
Vejo-os em cada objecto, em cada canto,aquela casa grita Rui e Isabel por todos os poros.
Não tolero ainda que a esvaziem de recordações. Sinto-me roubada...
Será isto negação, virar costas à realidade...não sei, só sei que me faz bem neste momento e preciso de todas as coisas q me dêem essa sensação.
Talvez um dia...talvez...Para já, sinto que já me esvaziaram o quanto baste, para agora deitar para o lixo, mais um pedaço de mim.

1 comentário:

Anónimo disse...

Filipa.
O que estás a sentir não é a negação é a saudade.Os teus pais serão sempre Imortais pois a alegria, a honestidade e a vivacidade com que tratavam os seus amigos jamais se apagarão da minha memória.
Que difícil é definir saudade e que força tem quando se sente!
Será talvez a força que mantém viva a presença da Isabel e do Rui, será o reviver de todos os momentos, será sentir a vossa falta.Saudade é certamente o dar a vida à vida que nos deixou tão cedo, mas que foi uma vida cheia de Beleza e de Amor.
Saudade é também recordar os momentos tão bons que passámos juntos e é certamente um lugar vazio que ficará sempre vazio no meu coração. Claro que terá que ficar sempre vazio o lugar daqueles foram os meus amigos, de que não esqueço as gargalhadas, o olhar, a voz, os gestos.
Como foi bom termo-nos encontrado e termos podido partilhar algum tempo das nossas vidas!
Se saudade é isto tudo, eu tenho muitas
saudades da Isabel e do Rui!

Um beijo gordo deixo-te com Fernando Pessoa.

Para ser grande, sê inteiro:nada
Teu exagera ou exclui
Sê todo em cada coisa. Põe quanto és
No mínimo que fazes.