Era cedo
Suave a lânguida preguiça que se roçava no meu corpo
De olhos semi-cerrados percorria as linhas da aguarela que se desenhava diante de mim
A voz do poeta perscrutava a minha memória e eu cantava com ele
Alentejo da minha alma
Adiante, a planície com sede de Primavera estendia-se para lá do meu olhar
No horizonte um azul tão cálido como quente, abraçava-a num fim que não acontecia
Como se não houvesse limite para toda a beleza que aflorava naquela manhã amena
Como um ciclo que se repete, nunca igual, a Natureza impunha-se perante tudo o que é artificial
E eu fiquei, só, sem me sentir sozinha, agradecendo-lhe baixinho por me deixar fazer parte dela
Alentejo da minha alma
Dissolvi-me no momento como quem encontra o seu lugar
Estendi-me na certeza de fazer parte do que agora encontrei
E fiquei, eu e o meu Alentejo, neste namoro natural
Repito este encontro de cada vez que a noite teima em não acabar em mim
Vou vê-lo amanhecer para que a manhã amanheça também em mim
Alentejo da minha alma
Dou-me à brisa como ao colo de uma mãe
Corro sem me mexer pelos vales intermináveis da beleza que esta terra pare a cada dia
E sinto em mim todas as certezas que não encontro nos prédios e nos carros da metrópole
Sou um espírito livre que segue nas costas do gado que se arrasta pela erva que o alimenta
Sou as asas das garças que mutualizam comigo esta comunhão
Aqui sou, tudo o que posso ser
E quando me despeço, nunca lhe digo adeus
Este quadro mora em mim para além daquilo que posso ver
É aqui que me irei plantar, na esperança que quando ninguém me puder regar
A chuva cessará a minha sede de querer sempre e sempre te contemplar
Alentejo da minha alma
Meu lugar